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Location: Porto Alegre, Brazil

Um índio!!!

Monday, October 09, 2006

Passeio diurno

Embarcou no ônibus. Depois de passar pela roleta cabisbaixo se agarrou em um ferro e continuou tranqüilamente a sua viajenzinha para lugar nenhum, pois estava desempregado e, portanto, não tinha nada melhor para fazer do que ficar dando voltas pela cidade. Percebeu que era o único que estava em pé. Olhou para os lados com o intuito de achar algum assento vago... Tudo em vão! Todos os lugares estavam ocupados, alguns por velhos, outros por crianças, bêbados... Todos tinham lugar naquela porcaria daquele ônibus - pensou ele - menos o bunda-mole aqui!
Havia quinze minutos que estava naquela situação, princípios de cãibra começavam a suceder em suas pernas, o suor já escorria como um riacho por suas costas; quando finalmente o veículo parou para que embarcasse outro passageiro. Era um velho mendigo fedorento e gozador, o qual já era muito conhecido pelos que faziam aquele trajeto diário.
O cobrador já rindo ao ver o "seu zé"- era por esse nome que as pessoas o conheciam - apenas piscou para ele, dando o sinal para que o pobre diabo passasse por baixo da roleta.
Depois de se arrastar marotamente "seu zé" viu o nosso protagonista Antônio - sim pacientes e cansados leitores, o nome do nosso protagonista é este - parou do seu lado, e com sua boca de raros dentes falou: porque está suando desse jeito? Não tomou banho hoje seu FIADAPUTA! O pessoal todo do ônibus desabou de tanto rir do pobre Antônio, o qual nem prestou atenção, pois no momento em que riam dele percebeu que alguém tinha descido, que ele poderia enfim sentar-se, suas pernas doíam muito, seus pensamentes giravam ao sabor das risadas... Poderia né? Claro que poderia! Se o "seu zé" deixasse! Quando Antônio deu dois passos em direção ao tão sonhado banco, o mendigo deu-lhe um empurrão com toda a sua força - já meio carcomida pela cachaça, mas, para esse tipo de coisa ele sempre teve força - no pobre Antônio, o qual caiu de beiço no chão... Os dentes rolando, as pessoas rindo, o sangue escorrendo na camiseta misturado ao suor, que agora não esguichava somente das costas, e sim do corpo todo. A raiva tomava conta de todo o seu ser, e embalado por ela pensava em todas as formas de se vingar do velho. Imaginava assim: ah velho fedorento dus diabo sarnento corno duma figa pedaço de merda se eu pegasse essa trava de saída de emergência eu enfiava nesse cú sujo desse velho porco atirava ele da janela arrancava o fígado e dava para os cachorro comê botava fogo em todo o corpo desse bosta desse miserável desse filho da puta desse... Em meio a todas essa maquinações de morte contra o velho, ele sentiu uma mão macia pegar na sua. Imediatamente ele se virou, e a dona da mão lhe disse: senhor, estamos passando em frente a um hospital, o senhor não quer descer e cuidar do seus ferimentos? O homem voltou a si. Percebeu que ainda restavam pessoas boas no mundo... Mesmo assim não escapou ao descer do ônibus de tomar uma cuspida na cara, cuspida que foi escarrada óbviamente pelo mendigo e que foi seguida de novas risadas - dessa vez mais estrondosas - dos passageiros.
Ainda bem que o pior já passou - pensanva ele muito perturbado com o seu passeio. Na verdade não estava só perturbado, estava tremendo de raiva ainda que aquela mão macia lhe acalmasse.
Quando entrou no hospital reparou que todos estavam olhando assustados para ele. Viu um espelho e decidiu parar para analisar a sua extrema miséria: estava sujo, suando, sangrando, sem os dentes da frente, ferido nos braços e nas pernas... Mas a dona das mãos macias estava sempre ali dando a maior força. Depois de alguns instantes chegou o médico para atender Antônio. O médico tinha fama de fanfarrão, e já chegou gozando da cara do Antônio, falando assim: Meu deus! O que faz uma moça tão bonita com um mendigo estropiado desses!
As enfermeiras acostumadas com as brincadeiras do médico desataram a rir, mas não por muito tempo... Antônio, que tocava violão há muitos anos. Todos os dias. Tinha as unhas da mão direita extremamente grandes para dedilhar o violão com mais facilidade. Teve uma idéia súbita quanto a outras serventias que suas unhas poderiam ter e com um gesto rápido enfiou seu dedo indicador - o qual continha uma unha enorme como todos os outros - no olho do médico. Antônio torcia o seu dedo dentro da órbita do médico, esmirilhando assim o olhar debochado do doutor. Sendo assim, Antônio foi preso, enlouqueceu na cadeia e foi mandando para um hospício. Surtava sempre que ouvia barulho de ônibus.

3 Comments:

Blogger Metamorfica said...

crei eu serem estas criaturas tão escatológicas que fazem o mundo girar e mutar em órbitas que ainda que pareçam ordenadas muito mais dessordenadas e graças ao movimento que nada fique estático! mãos acalentadoras me aprazem mas confesso prefiro aquelas que me fazem trucidar minhas construções anteriores e navegar em busca de mares nunca dantes percorridos!
gostei desse blog hein! continue a escrever contos eles libertam o que há de mais podre em nós! beijão!

2:04 PM  
Blogger Metamorfica said...

desoordenadas

2:05 PM  
Blogger bbp said...

Teu conto é ÓTIMO! Ele chama atenção no início, o que é fundamental...e nem dá pra imaginar o final. Tem o efeito da revelação no fim, eu acho mto legal quem consegue escrever bem assim. Gostei da unha no olho do médico...acho que ali ele se vingou de todos os passageiros sentados do ônibus.
ADOREEEI!
Escreve mais contos!

11:41 AM  

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